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José Paulo Kupfer

Juros caem, dólar sobe, inflação pode avançar, mas nem sempre. Entenda

José Paulo Kupfer

24/09/2019 18h10

O Banco Central reforçou, na ata da reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) da semana passada, divulgada nesta terça-feira (24), a mensagem de que a taxa básica de juros (taxa Selic) ainda recuará até no mínimo 5% nominais ao ano antes do fim de 2019. Os juros básicos estão em 5,5% depois do corte de 0,5 ponto porcentual decidido no último Copom.

Conhecida a ata, a discussão entre os analistas se concentrou em definir até onde o ciclo de cortes na Selic poderia ir. Mesmo com as indicações de preocupação do BC com o ambiente de crescente tensão na economia internacional, engrossou o contingente daqueles que apostam numa Selic em 4,5% ao ano, ainda em 2019, estacionando neste nível ao longo de 2020.

Essa é a perspectiva para a taxa Selic nominal. A taxa básica real de juros também está em queda — e ainda mais acentuada. Descontada da inflação presente, a Selic real (taxa real ex-post, no jargão dos economistas) encontra-se em 2,1%. Se recuar para 4,5% em dezembro, possivelmente descerá a 1,9%.

Para decisões de investimentos, porém, vale mais a taxa real ex-ante. Ela é calculada descontando a inflação projetada para os próximos 12 meses da taxa de juros embutida no contrato de swap de juros de 360 dias, negociado na B3. No momento, a taxa básica real bate em 1,37% anual, seu piso histórico. É possível que, acompanhando a descida da taxa nominal, termine 2019 em torno de 0,5%, em termos reais.

A questão de fundo, em ambiente de juros básicos bastante baixos, remete ao comportamento das cotações do dólar e sua influência sobre a inflação. Uma taxa de câmbio mais desvalorizada exerce pressão sobre a inflação, na medida em que ocorrem duas situações.

Na primeira, os produtos finais importados não só ficam mais caros, como também abrem espaços para aumentos nos preços dos concorrentes produzidos internamente. Na segunda, peças e partes importadas encarecem os custos de produção local.

Acontece que esses aumentos podem ou não chegar aos preços finais pagos pelos consumidores, resultando em pressões inflacionárias. Não é uma transmissão automática, dependendo das possibilidades de repasse dos custos aos preços.

Se a economia estiver desaquecida, como está neste momento, haverá dificuldade em repassar aumentos integrais de custo. A inflação mais baixa agradece, mas sobra redução de margens de lucro para fabricantes e comerciantes.

É essa menor possibilidade de repasse que anima os que apostam em novos cortes nas taxas de juros. No sistema de câmbio flutuante, que é o adotado no país, os mercados de juros e de câmbio operam como vasos comunicantes, operando em sentidos de direção opostos. Resumindo, a alta (ou baixa) de um estimula a baixa (ou alta) no outro.

Juros básicos mais baixos, por definição, quando o câmbio é flutuante, tendem a colaborar para aumentos nas cotações do dólar. O risco desses aumentos chegarem nos preços e daí na inflação também aumenta. Mas, passar do risco à concretização tem um caminho pela frente.

Na situação atual, com a economia ainda pouco menos de 5% abaixo do pico antes da crise de 2014, desemprego perto de 12% da força de trabalho (são 12 milhões de pessoas desempregadas e quase 30 milhões subutilizadas) e demanda enfraquecida, repasses de aumento de custos ficam mais difíceis.

Há, por isso, espaço para a promoção de novos cortes nos juros básicos, levando a política monetária a contribuir mais para empurrar a atividade econômica ladeira acima.

Sobre o Autor

Jornalista profissional desde 1967, foi repórter, redator e exerceu cargos de chefia, ao longo de uma carreira de mais de 50 anos, nas principais publicações de São Paulo e Rio de Janeiro. Eleito “Jornalista Econômico de 2015” pelo Conselho Regional de Economia de São Paulo/Ordem dos Economistas do Brasil, é graduado em economia pela FEA-USP e integra o Grupo de Conjuntura da Fipe-USP. É colunista de economia desde 1999, com passagens pelos jornais Gazeta Mercantil, Estado de S. Paulo e O Globo e sites NoMinimo, iG e Poder 360.

Sobre o Blog

Análises e contextualizações para entender o dia a dia da economia e das políticas econômicas, bem como seus impactos sobre o cotidiano das pessoas, sempre com um olhar independente, social e crítico. Finanças pessoais e outros temas de interesse geral fazem parte do pacote.