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José Paulo Kupfer

Brasil no fim da fila da OCDE não tem consequências práticas na economia

José Paulo Kupfer

10/10/2019 18h08

Do ponto de vista da economia, a volta do Brasil para o fim da fila do apoio dos Estados Unidos ao ingresso do país na OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico) não tem maiores efeitos práticos. O principal benefício que a carteira de sócio do "clube dos países ricos" pode trazer é um selo de confiança, naturalmente vinculado aos países que cumprem as regras e normas da organização.

Esse selo, é claro, facilita a realização de acordos comerciais e ajuda na atração de investimentos externos. Mas isso em tese. A atual situação, não só da economia brasileira, como também da economia global, não é a mais propícia para fechar acordos e, sobretudo, atrair investimentos.

"O ingresso agora na OCDE não traria ganhos econômicos palpáveis, diz a economista Monica de Bolle, pesquisadora sênior do Peterson Institute for International Economics e professora da Johns Hopkins University, nos EUA. "As vantagens seriam marginais".

Mesmo com o apoio americano, a entrada do Brasil na OCDE teria ainda percorrer um processo complexo de ajustes de regras e normas em diferentes áreas. Especialistas em negociações internacionais avaliam que esse processo poderia levar de três a cinco anos para ser concluído.

Comércio exterior, arcabouço fiscal e princípios de competição de mercado, por exemplo, seriam áreas críticas para a efetiva participação do país na organização. Só depois da adesão concreta às normas e regras da OCDE é que o tal selo de confiança então poderia, de fato, trazer benefícios.

Não foram poucos, a partir dos anos 90, os convites para que o Brasil estudasse ingressar na OCDE. Por causa de suas peculiaridades sociais e econômicas, que se traduziriam em dificuldades para cumprir exigências da organização, o Brasil não se interessou ativamente em considerar essa possibilidade. A mudança de atitude e o interesse na OCDE só veio a ganhar firmeza no governo Temer.

O aceno do presidente Donald Trump ao presidente Jair Bolsonaro, em relação ao apoio americano ao ingresso do Brasil na OCDE, parece ter sido mal interpretado pela diplomacia brasileira. A posição americana, de acordo com analistas a par do assunto, sempre foi a de que havia uma fila e que uma condição preliminar seria a de abrir mão do Tratamento Especial e Diferenciado (TED), concedido nas negociões da OMC (Organização Mundial de Comércio) a economias emergentes.

O Brasil abriu mão do TED, repetindo o gesto de Singapura, Coreia do Sul e Taiwan, antes de assegurar o voto americano para o início dos processos de ingresso na OCDE. Não ganhou a senha para entrar na OCDE e perdeu o status preferencial nas negociações no comércio exterior. Detalhe: a

Argentina, que estava há dois anos na fila de promessas de Trump de patrocinar a adesão do país vizinho à OCDE, nunca se manifestou oficialmente sobre o abandono do TED.

Juntamente com o Peru e a Bulgária, o Brasil continua na fila do patrocínio americano para ingresso na OCDE. Não deixou, portanto, de ter apoio, mas esse apoio não data fixada para se concretizar, ao contrário da decisão de Washington, em relação à Romênia e Argentina. A Argentina, contudo, caso se confirme a provável derrota do presidente Maurício Macri, nas eleições do fim deste mês para o candidato peronista Alberto Fernández, também deve recuar algumas casas no processo de ingresso na OCDE.

Sobre o Autor

Jornalista profissional desde 1967, foi repórter, redator e exerceu cargos de chefia, ao longo de uma carreira de mais de 50 anos, nas principais publicações de São Paulo e Rio de Janeiro. Eleito “Jornalista Econômico de 2015” pelo Conselho Regional de Economia de São Paulo/Ordem dos Economistas do Brasil, é graduado em economia pela FEA-USP e integra o Grupo de Conjuntura da Fipe-USP. É colunista de economia desde 1999, com passagens pelos jornais Gazeta Mercantil, Estado de S. Paulo e O Globo e sites NoMinimo, iG e Poder 360.

Sobre o Blog

Análises e contextualizações para entender o dia a dia da economia e das políticas econômicas, bem como seus impactos sobre o cotidiano das pessoas, sempre com um olhar independente, social e crítico. Finanças pessoais e outros temas de interesse geral fazem parte do pacote.