Coronavírus é a parte menor da culpa pela atual trajetória de alta do dólar
A cotação do dólar voltou a subir, nesta quinta-feira (27), e fechou a R$ 4,47, depois de bater em R$ 4,5 no meio do dia. Com a alta de 0,7% sobre o valor no dia anterior, já são 2% de avanço em três sessões, contando a sexta-feira (21), véspera de carnaval.
Isso mesmo com o Banco Central atuando para baixar a fervura da corrida pela compra da moeda americana. Só entre quarta e quinta, o BC ofereceu U$ 1,5 bilhão em swaps cambiais, uma forma de vender dólares com compromisso de recompra, sem morder as reservas cambiais, mas aumentando a dívida pública bruta, pois a operação é realizada em reais.
A rápida propagação para além da China do covid-19 – a gripe com risco respiratórios provocada por um novo e altamente contagioso coronavírus – está por trás de parte das pressões recentes sobre a cotação do dólar. A real possibilidade de quebra nos fluxos de moeda estrangeira para a economia brasileira explicam a trajetória de alta nesses dois dias pós-carnaval.
Não se pode, porém, esquecer que razões mais estruturais vinham, já há algum tempo, promovendo um movimento de valorização do dólar ante o real. De julho de 2019 até agora, a cotação da moeda americana avançou 18%. A escalada, numa visão mais ampla, teve início, ainda no governo Temer, em janeiro de 2018.
A alta adicional de responsabilidade dos temores com os impactos econômicos do covid-19 se sustenta na perspectiva de redução do fluxo de dólares para o Brasil em duas vertentes. Uma vinculada à possível redução, ainda que temporária, do ingresso de dólares via receitas de exportação. A outra, na medida em que pode haver cortes, mesmo não permanentes, na destinação por estrangeiros de dólares para investimento – direto ou de portfolio (mercado de capitais) – no Brasil.
As exportações brasileiras, principalmente para a China, devem sofrer cortes com a redução, ainda que temporária dos volumes vendidos em commodities agrícolas e metálicas e de seus preços nos mercados internacionais. Mas, também no caso da balança comercial brasileira, não se pode esquecer que o superávit – ou seja, a sobra em dólares – já vinha encolhendo. O superávit comercial desceu de US$ 65 bilhões, no fluxo em 12 meses, em outubro de 2017, para US$ 37 bilhões, nos 12 meses encerrados em janeiro de 2020.
Fonte de dólares para o mercado cambial, os investimentos estrangeiros também vêm sofrendo forte contração, nos últimos tempos. Os investimentos diretos, por exemplo, depois de um pico de US$ 105 bilhões, no acumulado em 12 meses, em janeiro de 2015, vêm recuando até bater em US$ 26 bilhões, nos 12 meses encerrados em janeiro de 2020. No lado das aplicações estrangeiras no mercado de capitais, cerca de US$ 40 bilhões deixaram o Brasil, em 2019.
Resumindo a história, o covid-19 ajudou a empurrar a cotação do dólar para cima, mas quando seu efeito passar, a moeda americana continuará valorizada ante o real. Uma política econômica que combina juros baixos com aperto fiscal resulta em dólar mais puxado. É essa a política que o governo tem praticado.
Se a isso forem adicionadas as turbulências políticas que o presidente Bolsonaro e alguns de seus ministros, inclusive Paulo Guedes, o superministro da Economia, não se cansam de produzir, é forçoso concluir que o covid-19 só pode ser responsabilizado por uma parte menor da atual trajetória de alta do dólar.
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