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Ranking põe Brasil no fim da fila como bom para fazer negócios; é justo?

José Paulo Kupfer

25/10/2019 04h00

Erramos: este conteúdo foi alterado*

A coincidência entre o momento de convulsão social no Chile e a divulgação, nesta quinta-feira (24), da versão 2020 do relatório Doing Business (DB), produzido sob o guarda-chuva do Banco Mundial, dá cores mais fortes às críticas e reprovações que sempre cercaram o trabalho. O DB se propõe a listar as economias mais reformistas do ponto de vista liberal, nas quais é mais fácil empreender e fazer negócios.

O Chile é a economia latino-americana mais bem colocada, no ranking de 2020, ocupando a 59ª posição entre 190 países. Como se pode constatar, diante da situação chilena atual, facilidade para fazer negócios não significa estabilidade social e política. Um bom ambiente de negócios, conclui-se, ainda que seja necessário, não é suficiente para que negócios, pessoas e países prosperem.

É típico dos rankings do Doing Business trazer países de economia inexpressiva à frente de potências econômicas. As Ilhas Maurício, por exemplo, pequeno conjunto de ilhas no Oceano Índico, em 13º lugar, com PIB (Produto Interno Bruto) de US$ 13 bilhões, estão à frente de Alemanha, Finlândia e Canadá em facilidade de empreender.

O Brasil, ninguém duvida, não é flor que se cheire no quesito bom ambiente de negócios para empreendedores. Na lista deste último DB, por exemplo, o país caiu 15 posições, indo parar no 124º lugar num total de 190 países avaliados. Vem logo abaixo de pequenas economias africanas, caso de Lesoto, Suazilândia e Senegal.

Ficou atrás, só para falar nos vizinhos sul-americanos, de Chile, Colômbia, Peru e Uruguai. Argentina e Paraguai vieram logo abaixo, com Bolívia, Equador e Venezuela, mais distantes, nas últimas posições do ranking. 

Não é que a posição brasileira na lista devesse ser muito diferente. Afinal, no Brasil, a burocracia é exasperante, a carga tributária, um labirinto impenetrável, e entraves de todo tipo se combinam para infernizar a vida de quem se aventura a empreender. Mas, ao longo do tempo, o país tem sido injustiçado pelo DB.

Em edições passadas, mudanças na metodologia de organização do ranking, que alteraram pesos de itens considerados, prejudicaram a nota brasileira. O Brasil também tem sido vítima da qualidade da informação fornecida ao Doing Business pelos próprios brasileiros.

Uma associação, reunindo Febraban (Federação Brasileira de Bancos), Fecomercio (Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo) e instituições financeiras, trabalhou, no início da década atual, para melhorar o preenchimento dos questionários enviados ao DB. Esse esforço ajudou a melhor algumas posições do Brasil no ranking, mas o DB continuou desconsiderando melhorias regulatórias adotadas pelo Brasil.

No relatório de 2020, o problema voltou a ocorrer. O governo Bolsonaro está contestando o aumento no custo para conseguir uma instalação elétrica, apontado no relatório. Segundo o secretário especial de Produtividade, Emprego e Competitividade, Carlos Da Costa, a elevação de custo detectado pelo DB é "inexplicável". Além disso, incrementos trazidos pela chamada lei da liberdade econômica, aprovada depois do fechamento da presente edição do Doing Business, obviamente, não foram incorporados.

O Doing Business está na sua 17ª edição, acumulando críticas e polêmicas. Em 2008, o Grupo Independente de Avaliação (IEG, na sigla em inglês), uma espécie de ombudsman do Banco Mundial, criticou, oficialmente, o trabalho, obrigando seus responsáveis a publicar ressalvas.

No ano passado, Paul Romer, Prêmio Nobel de Economia, então economista-chefe do Banco Mundial, entrou em polêmica com o DB e acabou renunciando ao cargo. Romer acusou o DB de manipulação metodológica em anos anteriores, com o objetivo de prejudicar a nota do Chile durante governos da centro-esquerdista Michelle Bachelet.

Depois de polêmicas e críticas, os relatórios anuais do Doing Business,  passaram a trazer ressalvas explícitas em suas páginas. "As evidências, interpretações e conclusões expressas neste trabalho não refletem necessariamente as opiniões da Banco Mundial, de sua Diretoria Executiva ou dos governos que eles representam", lê-se na página das informações legais. "O Banco Mundial não garante a precisão dos dados incluídos neste trabalho."

*Errata: o texto foi atualizado — No quinto parágrafo, o México havia sido citado entre os vizinhos sul-americanos. A informação foi corrigida.

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Sobre o Autor

Jornalista profissional desde 1967, foi repórter, redator e exerceu cargos de chefia, ao longo de uma carreira de mais de 50 anos, nas principais publicações de São Paulo e Rio de Janeiro. Eleito “Jornalista Econômico de 2015” pelo Conselho Regional de Economia de São Paulo/Ordem dos Economistas do Brasil, é graduado em economia pela FEA-USP e integra o Grupo de Conjuntura da Fipe-USP. É colunista de economia desde 1999, com passagens pelos jornais Gazeta Mercantil, Estado de S. Paulo e O Globo e sites NoMinimo, iG e Poder 360.

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Análises e contextualizações para entender o dia a dia da economia e das políticas econômicas, bem como seus impactos sobre o cotidiano das pessoas, sempre com um olhar independente, social e crítico. Finanças pessoais e outros temas de interesse geral fazem parte do pacote.


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